segunda-feira, 5 de março de 2012

As contas dos escalões do IRS.

Causa-me alguma estranheza a confusão que os escalões do IRS causam a muita gente. O IRS define escalões que são aplicados progressivamente a intervalos de valores (de rendimentos). Assim, a ideia de se perder dinheiro por se estar estar pouco acima de um escalão é errada, porque apenas o montante que fica acima desse escalão paga essa taxa. Isto contraria aquele mito urbano clássico em que uma pessoa que tenha rendimentos pouco abaixo do limite superior de um escalão, ao ser aumentada e subir de escalão, fica a perder porque passa a pagar mais impostos. A pessoa não perde rendimento em relação ao que ganhava antes, embora possa ficar com mais dinheiro retido no âmbito do IRS, logo com menos liquidez mensal.

Agora veja-se este artigo. Começa o senhor por dizer: “Não sou fiscalista, sou economista, mas numa altura em que o Governo ajustou os impostos diretos (novos escalões e novas taxas de IRS) e indiretos (subida de IVA em alguns produtos e serviços) partilho as seguintes reflexões.”, para mais à frente nos deixar a seguinte reflexão: “Não me parece justo que um indivíduo que tenha um rendimento de 155 mil euros brutos anuais pague a mesma taxa (46,50%) de imposto sobre o rendimento que um indivíduo que tenha um rendimento de 1550 mil euros brutos anuais. Reconheçamos que viver com 82,9 mil euros líquidos anuais é extraordinariamente bom mas não é claramente igual a viver com 829 mil euros líquidos anuais. Porque estamos a privilegiar os mais ricos, dos mais ricos, com este sistema? Porque não continua a progressividade? Fuga de capitais? Isso é ceder à chantagem, o que é um péssimo princípio.”.

Consultando os escalões de IRS para 2012 e ignorando deduções específicas e outras nuances do nosso complexo sistema fiscal, considerando somente as taxas aplicáveis, temos o seguinte:

  • rendimento 155000: paga 0,38654 * 153300 + ( 155000 - 153300 ) * 0,4650 = 60047,082, ou seja 38,74% do seu rendimento:
  • rendimento 1550000: paga 0,38654 * 153300 + ( 1550000 - 153300 ) * 0,4650 = 708722,082, ou seja 45,72% do seu rendimento.

O segundo caso paga mais 6,98% que o primeiro e não o mesmo como diz o autor. Se são ou não valores baixos face aos rendimentos, é outra conversa, mas são diferentes.

Porque não continua a haver progressividade nos escalões, pergunta o autor. Porque provavelmente não existem sequer suficientes casos que o justifiquem — as últimas vezes que os impostos aumentaram para os maiores escalões verificou-se que o número da famílias afectadas era residual, afinal para quê obter rendimentos sujeitos a 46,5% de IRS quando se podem obter dividendos taxados a 21,5%? — ou porque desincentiva o crescimento de rendimento.


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